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Ditadura Militar Brasileira: Propaganda, Censura, Repressão e Resistência

No contexto da ditadura militar (1964-1985) brasileira o direito a liberdade de expressão, a liberdade de reunião e de manifestação foi cassado, as eleições presidenciais diretas foram suspensas, a oposição foi cerceada, as críticas ao governo dos militares eram reprimidas, os meios de comunicações e atividades artísticas foram censurados, pessoas ligadas a grupos de oposição a ditadura foram presas, torturadas, assassinadas e outras desaparecidas. A repressão política dos governos militares iniciou desde seu primeiro momento de instalação do golpe de Estado que depôs o presidente João Goulart (1964). Prisões, torturas e assassinatos de pessoas ligadas a partidos de esquerda, sindicatos, movimento estudantil e movimentos sociais foram praticadas desde 1964. A partir daí as práticas foram recorrentes em todo o período da ditadura.
O período de 1964 a 1968 foi marcado por forte repressão do regime militar aos opositores, com prisões, interrogatórios, inquéritos militares, torturas, assassinatos e desaparecimentos de opositores do regime militar. A resistência a ditadura militar foi protagonizada por estudantes, professores, políticos, artísticas, trabalhadores e sindicatos. As primeiras greves depois do golpe em ocorreram em 1968 na cidade de Osasco. Estudantes através em movimento estudantil secundário e universitário; artistas através de filmes, músicas e peças de teatro faziam críticas e oposição ao governo dos militares. Neste contexto cantores como Chico Buarque, Geraldo Vandré, Caetano Veloso e Gilberto Gil faziam críticas veladas ou abertas em suas músicas. O ápice do movimento de oposição ocorreu em 1968 com o movimento da passeata dos 100 mil no Rio de Janeiro. 

A MPB nos tempos da ditadura - Programa Ensaio da TV Cultura. 

Documentário: Uma noite em 67, O documentário apresenta a produção musical em torno do Festival de Música Popular Brasileira da TV Record..
  Falta do poeta Ferreira Gullar sobre a passeata dos 100 mil em  1968.

De acordo com o historiador Carlos Fico, a trajetória da ditadura militar brasileira pode ser compreendida a partir do movimento de ascensão dentro do governo de um grupo de militares chamados de “linha dura”, isto é, militares que tinha um forte discurso anticomunismo, anticorrupção e autoritário. Este grupo de militares desejava maiores prazos para completar os expurgos, perseguições e prisões iniciadas em 1964. Num primeiro momento, o grupo dos militares da “linha dura” constituía enquanto uma confraria de oficiais que pressionavam por mais punições. A ascensão da “linha dura” veio com a posse do general Costa e Silva na presidência (1968). Num segundo momento, o grupo institucionalizou-se no aparato repressão do Estado.  A partir deste grupo foi montada uma vasta rede de espionagem e repressão política em todo o país.
O período de maior intensidade da repressão ocorreu a partir da publicação do Ato Institucional Número 5 – AI5 em 1968. Os atos institucionais eram decretos que modificava a legislação vigente sem discussão parlamentar. Com a decretação do AI-5 houve suspensão de direitos políticos e mandatos eletivos, fim do direito de pedido de habeas corpus para crimes considerados de natureza política e criado a censura prévia as atividades de imprensa e artísticas. Segundo Carlos Fico, as motivações que levaram a edição do AI-5 ocorreram em decorrência da insatisfação dos militares da “linha dura” com o andamento dos Inquéritos Policiais Militares – IPM, pois as tentativas de punições através dos IPMs esbarravam na concessão dos pedidos de habeas-corpus na Justiça.
A partir da decretação do AI-5 o regime militar foi marcado pelo endurecimento da repressão. Neste contexto os governos militares criaram órgãos de segurança e informação. Sendo órgãos de informação direcionados a espionagem de assunto ou pessoa de interesse do regime militar, e os de segurança, responsáveis por prisões, interrogatórios, torturas, seqüestros, assassinatos e desaparecimentos.  Com o surgimento de grupos de guerrilha em 1968, a repressão da polícia política começou-se a estruturar-se. A partir da Operação Bandeirante (1969), criada para combater os grupos armados em São Paulo, o sistema da repressão política da ditadura militar começou a atuar de maneira organizada. Foi montando então um aparato para controlar as medidas de repressão, chamados de DOI-CODIs, coordenados pelos comandos das unidades do exército. Nas prisões e operações da polícia política assassinatos e sessões de torturas eram praticados, sendo utilizados contra os grupos guerrilheiros ou pessoas consideradas como subversivas ou suspeitas. A submissão a tortura foi amplamente utilizada na repressão dos grupos da luta armada contra a ditadura militar, como forma de obter a delação informações de locais de encontro, de nome de integrantes e ações planejadas.
Um dos órgãos criados para auxiliar as atividades de repressão política dos governos militares foi o Serviço Nacional de Informação (SNI). Criado em 1964 o SNI cresceu a partir do governo de Costa e Silva (1968). O órgão federal tinha status de ministério, funcionava nos ministérios civis e trabalhava no levantamento de informações e contra-informação em todo o território nacional. Os ministérios militares (Marina, Exército e Aeronáutica) tinham órgãos de informação específicos, que atuavam de maneira mista, tanto trabalhavam com informações como atividades de segurança (prisões, interrogatórios e tortura). O SNI e o demais órgão de informação atuavam na investigação de assuntos e pessoas consideradas suspeitas de subversão ou corrupção, formavam o que o historiador Carlos Fico chamou de “comunidades de informações”.
A partir da decretação do Ato Institucional número 5 (AI-5) a censura ocorreu de maneira mais sistemática. A censura institucional visava vetar às críticas ou informações contrárias ao regime e defendia um discurso moralista sobre as produções artísticas. Nos jornais, ocorria a censura prévia, quando fazia-se o exame da publicação antes de entrar em circulação pública, como também acontecia o acompanhamento nas redações de jornais e revistas. Ambos os procedimentos obedeciam à classificação de assuntos que deviam ser censuradas na ótica dos governos militares e seus órgãos de segurança e informação. Além disso, os censores federais debruçavam-se sobre as chamadas “diversões públicas”, que compreendia atividades como teatro, televisão, cinema, música e cerco. A censura das “diversões públicas” procurava vetar assuntos interditos em nome da moral e dos bons costumes.
A propaganda política serviu-se como instrumento por meio do qual os governos militares procuravam se firmar. No governo do general Costa e Silva (1968) foi criada a Assessoria Especial de Relações Públicas (AERP), órgão que tinha como objetivos  o estímulo o amor a pátria, ao trabalho, a confiança no governo, o culto a união familiar e produção de uma imagem positivo do país no exterior. De tal maneira, o citado órgão produzia filmes, campanhas oficiais, músicas e slogans de caráter educativo, moral, ufanista.
       Um dos momentos de destaque do uso da propaganda pela ditadura militar ocorreu na década de 1970. Entre os assuntos explorados pela publicidade oficial da ditadura (veiculados em rádios, jornais, cartazes, televisão) esteve o acentuado crescimento econômico do país, o chamado milagre brasileiro (1968-1974), a construção de obras faraônicas pelo governo federal (exemplo da Transamazônica e da hidrelétrica de Itaipu), e o evento da copa do mundo no México em 1970. No caso do campeonato mundial de futebol, o bom desempenho e a vitória da seleção brasileira foram associados à imagem do país e do governo dos militares. As propagandas oficiais procuravam transmitir para a sociedade brasileira os sentimentos de nacionalismo, patriotismo e de otimismo com o governo. Na época foram disseminados slogans como: “Ninguém segura esse país”, “Brasil, ame-o ou deixe-o!” e “Este é um país que vai pra frente”.
                          Brasil Tri Campeão Copa do Mundo 1970
Vista de Pelé ao general Médici 
Pelé com a taça da Copa do Mundo (1970) ao lado do general Médici
  Propaganda da ditadura militar
                                    Propaganda da ditadura militar
    Propaganda da ditadura militar
                                     
Na década de 1960, o contexto internacional foi marcado por experiências revolucionárias e exemplos de ação de luta armada, eventos como a Revolução Cubana, a Revolução Chinesa, os movimentos de independência dos países africanos e a Guerra do Vietnã. A experiência de Cuba fez exportar para a América Latina a teoria do foquismo, que constituía basicamente na ideia de criar vários focos de guerrilha no campo, de maneira que o grupo guerrilheiro pudesse ganhar apoio popular e conduzir um processo revolucionário. A guerra do Vietnã (1955-1975) que envolveu um exército profissional, do governo estadunidense contra uma guerrilha de camponeses, mostrava que mesmo diante da inferioridade bélica e numérica dos vietnamitas, eles venciam o combate.  A tática de ação na forma de guerrilha e a determinação de lutar contra os invasores norte-americanos colocavam os vietnamitas na condição de vantagem no enfrentamento.
No Brasil, a partir do final dos anos 60 grupos de esquerda, de diferentes matizes, animavam a luta armada nas cidades e no campo, com o projeto de derrubar a ditadura militar e instalar um governo revolucionário. As ações nas cidades envolveram assaltos a bancos como meio de arrecadar dinheiro para a luta armada, e seqüestros de embaixadores, para libertação de presos políticos e propaganda da resistência armada à ditadura. Dos grupos de guerrilha urbana destacou-se a figura de Carlos Marighela, uma das principais lideranças da luta armada contra a ditadura militar, era militante do grupo chamado de Aliança Libertadora Nacional – ALN. A atuação do grupo de Carlos Marighela caracterizou-se pela ação do foquismo e pela atuação da guerra de guerrilha, praticada no ambiente urbano. 
          Documentário sobre Carlos Marighela 
                      
                     Filme Lamarca. Direção: Sérgio Rezende. 
                         
Dos movimentos de guerrilha rural, a chamada guerrilha do Araguaia, reuniu um grupo de militantes ligados ao PC do B, partido revolucionário de influência maoísta e inspirado na Revolução Chinesa. Os revolucionários do PC do B, inspirados pela Revolução Chinesa e Cubana defendiam que o movimento revolucionário no Brasil devia começar no campo, assim, numa área rural entre os Estados de Goiás, Pará e Maranhão montaram um foco guerrilheiro a partir de 1967. Jovens universitários e profissionais liberais de diferentes regiões do país migraram para o local e passaram conviver com a população nativa - às margens do rio Araguaia. Na região os militantes chegaram com o objetivo de fazer um trabalho política com os trabalhadores rurais, fomentar o levante da população, primeiro na área rural e depois urbana. A finalidade do movimento era derrubar o governo dos militares, tomar o poder, e instalar um governo comunista no Brasil.
Contudo, os militantes do PC do B foram descobertos pelo Exército, sendo a partir de 1972 montada uma operação de guerra para desmantelar a organização. As ações militares na região abrangeram o uso da prática da tortura e o assassinato dos trabalhadores rurais e dos guerrilheiros. A resistência dos militantes e dos trabalhadores rurais as incursões militares do Exército perduraram por dois anos. A partir de 1975 as operações militares foram consideradas encerradas, dos militantes e camponeses alguns foram presos, vários assassinados, outros os corpos não foram localizados.
            Camponeses do Araguaia: A Guerrilha vista por dentro. 

    A atuação dos grupos de luta armada adotava a ideia de vanguarda revolucionária, a qual defendia o papel de um grupo de militantes na condução do processo revolucionário. A supervalorização da ideia de vanguarda levou os grupos que engajaram na luta a armada contra a ditadura a cair no militarismo e no isolamento. O problema da organização da vanguarda era a falta de identidade do projeto da revolução com a sociedade civil. Em outros termos, de maneira geral a ação dos grupos armados esbarrava na falta de articulação com a classe trabalhadora. Os órgãos de repressão passaram a utilizar da tortura nos presos dos grupos armados, a assassinar lideranças e membros das organizações e aperfeiçoaram suas formas de atuação. No final da década de 1970 os grupos armados haviam sidos exterminados pelos órgãos de repressão.





                                                                           

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